quinta-feira, 12 de março de 2009

[Watchmen]: Entrevista com o Diretor Zack Snyder



Se alguém em Hollywood que poderia ter filmado a infilmável obra de Alan Moore e Dave Gibbons, esse alguém só poderia ser Zack Snyder.
Depois de mostrar competência em Madrugada dos Mortos e transformar 300 em um mega-sucesso, o cara virou um dos queridinhos de Hollywood, ao lado de Peter Jackson, Sam Raimi, Guillermo Del Toro, George Lucas e Steven Spielberg.
Tanto que ele já tem vários projetos futuros sendo encaminhados. Mesmo que você não goste de algum filme anterior dele, não há como negar o seu brilhantismo.
Fã de quadrinhos, Snyder tentou ser o mais fiel possível à obra de Moore e Gibbons, sendo que Watchmen já estra para a história dos filmes cult.

A seguir, uma entrevista cedida pelo cineasta ao editor Érico Borgo, do site Omelete:


Onde você estava quando a graphic novel saiu?

Eu estava na universidade. Quando a HQ saiu, em 1985, eu estava em Londres. Quando voltei, em 1986, para estudar cinema em Pasadena, tinha perdido as edições avulsas, em 12 partes. Mas quando saiu o encadernado em 1988 eu comprei.

O que você sentiu quando a leu pela primeira vez?

Foi um choque. Eu li esperando uma história em quadrinhos normal. Quando terminei senti que tinha passado por uma experiência inesperada que mudou para sempre minhas expectativas sobre os super-heróis e o que eles poderiam ser. Eu torço para que essa seja a experiência para quem for assistir ao filme e não tiver lido a graphic novel - esse é o público que acredito que mais usufruirá da adaptação. Eles terão a experiência que eu tive quando li a HQ, espero. "Cadê meu filminho comportado e fácil de digerir?" Aquela coisa meio virginal, uma expectativa pelo usual e a surpresa quando aquele mundo começar a ruir e os temas políticos, sociais, religiosos e morais aflorarem.

E quando o pênis do Dr. Manhattan aparecer.

Ahahaha, sim. Aquilo foi uma escolha consciente. Cada frame em que o pênis dele aparece foi uma escolha meticulosa. Mas não havia como ser de outra maneira. O personagem é inumano, ele não dá a mínima para as nossas convenções sociais, como vestir roupas. É também um conceito simples, mas poderoso: Superman pelado. É insano.

E como foi seu processo de trabalho nesse? O filme é muito diferente de 300.

Foi exatamente o mesmo. Se você olhar meus storyboards verá que os meus desenhos para Watchmen são parecidíssimos com os que fiz para 300. O que mudou foi só a pré-produção, já que para este tinhamos cenários de verdade que tiveram que ser construídos. Mas o processo, para mim, foi o mesmo em quase todos os aspectos.

O filme é quase em sua totalidade absolutamente fiel em termos narrativos e visuais à graphic novel.

Eu sou um grande fã de Watchmen. Para mim, adaptar o filme era uma questão de reproduzir todos os elementos que mexeram comigo quando a li da primeira vez. Algumas pessoas têm reclamado na Internet "quem diabos é você pra definir o que é importante ou não em Watchmen?". Não tenho resposta pra isso além de isso é tudo o que eu tenho, minha visão e experiência da obra. Mas em todos os momentos eu quis ter certeza que certos elementos-chave da graphic novel fossem fielmente retratados no filme. Watchmen é algo especial é merece ser tratado com cuidado.

Essa fidelidade causou uma série de brigas com o estúdio, não?

Eu não gosto de chamar o que tivemos de brigas. Foi apenas um processo de entendimento deles do material e do filme. No início eles não entendiam nada. Entendiam, sim, o roteiro que tinham, mas nada além disso. Não compreendiam os temas e a importância da obra original.

Inicialmente o texto era uma versão modernizada e atual da história, um filme feito para censura 13 anos em que o herói, o Coruja, mata o bandido no final. Era um filme típico de Hollywood, com potencial para franquia. Nada contra eles, afinal, esse é o negócio dos caras, criar franquias, fazer dinheiro... É o trabalho deles. Eu provavelmente sou um cara difícil pra trabalhar quando se trata desse tipo de expectativa. Imagine minhas primeiras reuniões, pedindo censura 18 anos, 5 horas de duração, gente trepando e um puta filme complicado. Mas não foram brigas - foram diálogos. Eu cedi em alguns pontos, mas eles me deram muitos outros e no final entenderam que esse livro é sobre ideias. Mais do que isso, é um livro que vai contra o princípio das franquias.

Desde o começo achei irônico que Hollywood estava pensando em fazer um filme de Watchmen sendo que Watchmen caçoa de Hollywood, seu princípio é justamente destruir certos conceitos, especialmente o dos super-heróis como franquia. Me surpreende que eles tenham entendido isso no final e aceitado meus termos. Me deram menos dinheiro, mas aceitaram, mesmo sabendo que perderiam a chance de fazer brinquedinhos de McLanche Feliz dessa forma - algo que eles queriam. Se o filme tivesse censura 13 anos eles certamente o fariam, o que eu acho bizarro... afinal, mesmo que eu não mostrasse certas cenas e conseguisse baixar a censura, as ideias ainda permaneceriam. Não é como o Batman, em que ele surra e aleija alguns vilões, mas eles são "maus" - ninguém pensa que o cara que cometeu o crime podia estar desesperado, ter filhos em casa, ter acabado de conhecer o Coringa, etc. Em Watchmen não há ação sem consequência.

Enfim, acho que a Warner entendeu que o mercado está saturado de filmes de super-heróis e que talvez fosse mesmo a hora de dar uma sacudida no gênero.

Você mencionou que cedeu em alguns pontos. Quais?

A minha versão final, sem os Contos do Cargueiro Negro - que saiu separamente em DVD -, é de 3 horas e 10 minutos. Será mais sexy, mais violenta e mais louca que o filme que vai para os cinemas. Tive que tirar, por exemplo, a morte de Holis Mason para fazer caber. É um filme que está passando em IMAX e sou um sujeito racional, afinal. Eles têm um limite de duração e fiz com que o filme encaixasse dentro dessa limitação. Sem o IMAX eu limitaria o acesso às salas de exibição e sempre foi minha intenção que o filme chegasse ao maior número de pessoas possível, o público consumidor de cultura pop e filmes de super-heróis. Um filme de 3 horas tornaria isso muito mais difícil, então fizemos uma versão para cinema com 2h30.

Quando nós veremos essa versão do diretor?

Espero colocá-la nos cinemas em circuito restrito em julho e ela também será lançada em DVD e blu-ray.

Aquela HQ animada que está sendo lançada de Watchmen tem 6 horas e meia de duração. Isso significa que o filme poderia ter ficado duas vezes mais longo?

Se nós tivéssemos filmado cada quadrinho da HQ, provavelmente sim. Seis horas, seis horas e meia. E isso sem contar pausas dramáticas de atores.

Nenhum comentário: